Além do setembro amarelo: Conscientização de valorização da vida deve ser mantida durante todo o ano. Maria Alice Fontes

O mês de setembro é amarelo, a cor que carrega um significado crucial: a conscientização e prevenção ao suicídio. 

Em 10 de setembro de 1994, no Colorado, Estados Unidos, o jovem Mike, de 17 anos, tirou sua vida com uma arma de fogo. No interior do seu Mustang 68 amarelo, totalmente restaurado por ele mesmo, Mike deixou um bilhete para sua família: “não se culpem, eu amo vocês”. Na despedida, a família decidiu distribuir fitas amarelas para alertar sobre a dor que provoca a perda de uma vida. Na fita estava escrito: “Se você precisar, peça ajuda”.

Esta ação ultrapassou fronteiras e viralizou mundo afora. Após ter mais de 20 milhões de mensagens compartilhadas, a Organização Mundial da Saúde escolheu simbolicamente a cor amarela e elegeu o dia 10 de setembro como Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, um alerta para o sofrimento causado pelas doenças psicológicas e um momento para a reflexão e o apoio às pessoas que precisam de ajuda para preservar a vida.

No Brasil, a Campanha Setembro Amarelo foi instalada em 2015 com o decisivo apoio do Centro de Valorização da Vida (CVV), do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP). Este ano, a campanha fortalece e retoma a solidariedade com a família de Mike e adota novamente o lema: Se precisar, peça ajuda!

O período chama a atenção para a importância de falar sobre sentimentos, valorizar as emoções, a escuta qualificada e a necessidade de buscar ajuda em qualquer tempo, sem constrangimentos seja qual for a faixa etária.

Números Alarmantes 

O suicídio é um importante problema de saúde pública, com impactos contundentes na sociedade. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), todos os anos, mais pessoas morrem como resultado de suicídio do que HIV, malária, câncer de mama ou guerras e homicídios

De acordo com a última pesquisa realizada pela OMS em 2019, são registrados mais de 700 mil suicídios em todo o mundo, sem contar com os episódios subnotificados, pois com isso, estima-se mais de 1 milhão de casos. No Brasil, os registros se aproximam de 14 mil casos por ano, ou seja, em média 38 pessoas cometem suicídio por dia.

Entre os jovens de 15 a 29 anos, o suicídio foi a quarta causa de morte depois de acidentes no trânsito, tuberculose e violência interpessoal. Trata-se de um fenômeno complexo, que pode afetar indivíduos de diferentes origens, sexos, culturas, classes sociais e idades. 

A OMS destaca que praticamente 100% de todos os casos de suicídio estavam relacionados aos transtornos mentais, principalmente não diagnosticados ou tratados incorretamente. Dessa forma, a maioria dos casos poderia ter sido evitada se esses pacientes tivessem acesso ao tratamento psiquiátrico e informações de qualidade.

Entre os transtornos mentais associados ao suicídio, a Depressão se destaca (McGirr, A. et al, 2007). Os outros que aparecem na literatura associados ao suicídio são os transtornos bipolares do humor, abuso de álcool, esquizofrenia e transtornos de personalidade (Meleiro, 2004).

Refletir sobre Suicídio é também analisar por que este fenômeno tem sido silenciado ao longo dos anos, camuflando assim um grave problema de saúde pública no Brasil e no mundo (Botega, 2002). O fato é que este silêncio não ajuda, é preciso abordar o suicídio de forma responsável e realística, para ajudar na prevenção.

Como reconhecer transtornos mentais

Alguns comportamentos podem indicar ideação suicida. Eles podem ser reconhecidos pela própria pessoa ou por uma rede de apoio.

1- Isolamento progressivo do convívio social
2- Humor deprimido
3- Melhora brusca após período de humor deprimido
4- Insônia ou muito sono
5- Desesperança e falta de planos para o futuro
6- Falta de prazer nas atividades anteriores
7- Mudança na alimentação (passar a comer muito ou não comer)
8- Mudança de comportamentos que provocam perda na qualidade de vida

Isolamento, sumiço das redes sociais, mudanças repentinas de humor, ansiedade, irritabilidade, alterações no padrão alimentar, insônia ou muito sono podem ser sinais de ideação suicida. É neste momento que amigos, parceiros, familiares e colegas podem ajudar. A rede de apoio pode alertar a pessoa sobre uma mudança de comportamento ao identificá-la.

Tentativas e pensamentos suicidas no Ambiente Corporativo – Aumento de 367% em 2023 

Um levantamento realizado com 300 empresas, pela Mental Clean Consultoria de Saúde Mental no Trabalho, mostrou que os índices de tentativa e ideação suicidas tiveram um aumento de 367% em 2023.

A média de idade das pessoas atendidas foi de 31 anos, sendo 66% mulheres. Além dos registros, observou-se um aumento considerável também nos mapeamentos de saúde mental realizados pela Mental Clean, nos quais os dados variaram cerca de 2%, chegando a ter de 7% a 10% de respondentes referindo “ter tido ideia de acabar com a vida”.

A sensação de ser um fardo, o desespero e a desesperança são sentimentos comuns a quem passa por esse tipo de situação. Uma atuação imediata de apoio e orientação não só para a pessoa, mas também para a empresa e os familiares, pode fazer a diferença.

Sinais de alerta vão desde a mudança de comportamento mais explícita, com isolamento e falas sobre o desejo de morrer, até itens sutis, como a diminuição gradual do autocuidado.

Prevenção ao suicídio: Onde procurar ajuda

Vale ressaltar a importância de procurar ajuda de profissionais qualificados, caso o indivíduo tenha esses tipos de pensamentos ou vontade de acabar com a própria vida.

Centro de Valorização da Vida: Telefone 181 (ligação gratuita) ou www.cvv.org.br para chat, e-mail. O CVV realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo por telefone, email e chat 24 horas todos os dias.

Diante deste panorama, onde o suicídio ainda é tratado como tabu, surge à necessidade de desmistificar o tema, não só no mês de setembro, mas ao longo de todo o ano, levando em consideração o trauma que o suicídio acarreta ao meio social. 

Como se trata de um assunto polêmico, gerador de muita angústia e disparador de fantasias, é preciso sensibilizar a sociedade para a importância de um olhar menos amedrontado e mais acolhedor, onde o sofrimento do outro possa ser mais escutado, possibilitando intervenções. 

A vida humana é preciosa e insubstituível. É a valorização da vida que pode superar problemas e dificuldades, construir soluções e fortalecer trajetórias de felicidade e de realização.

Colaboração: Mônica Merlini

Referências:

Botega NJ. Prática Psiquiátrica no Hospital Geral: interconsulta e emergência. Porto Alegre: Artmed; 2002.

McGirr, A., Renaud, J., Seguin, M., Alda, M., Benkelfat, C., Lesage, A., et al. (2007). An examination of DSM-IV depressive symptoms and risk for suicide completion in major depressive disorder: A psychological autopsy study. Journal of Affective Disorders, 97(1-3), 203-209.

Meleiro A, Teng CT, Wang YP. Suicídio: estudos fundamentais. São Paulo: Segmento Farma; 2004. 

https://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/especial-publicitario/mental-clean/noticia/2023/09/05/tentativas-e-pensamentos-de-suicidio-em-empresas-aumentaram-367percent-em-2023.ghtml