A importância do não fazer nada. O que acontece com o cérebro quando você está inativo e a relação com saúde mental. Maria Alice Fontes

O tédio, muitas vezes considerado uma experiência monótona e desagradável, pode, na verdade, desempenhar um papel interessante na saúde mental e na ativação da Default Mode Network (DMN) do cérebro, levando a uma experiência de reflexão interna e autorreflexão. Essa ativação pode ter consequências importantes aumentando nossa criatividade, e a longo prazo, nosso comprometimento com as tarefas e nossa produtividade no trabalho.

Quando não estamos ocupados com tarefas específicas, nossa mente tem a oportunidade de explorar pensamentos menos convencionais, contribuindo para a geração de ideias inovadoras. 

Por exemplo, já reparou que é comum termos ideias inovadoras durante o banho? Neste momento de rotina e relaxamento, a mente está propícia para ativar a DMN e aumentar a criatividade

Na esfera da saúde mental, o tédio desempenha um papel importante na busca de um equilíbrio saudável entre estímulo e repouso mental. Periodicamente, permitir-se experiências de tédio pode contribuir para o autoconhecimento e a reflexão, permitindo-nos considerar nossas metas, valores e interesses.

A psicóloga britânica Sandi Mann argumenta no livro The Science of Boredom (“A ciência do tédio”, em tradução livre) que o tédio “pode ser uma força poderosa, motivadora, que inspira criatividade, pensamento e reflexões inteligentes”.

Mann aconselha os pais a deixar os filhos sentirem tédio. “Deixe que eles aprendam a lidar com o tédio e a sair dele. Assim eles vão se libertar para um mundo de criatividade.”

Contudo, é crucial encontrar um equilíbrio adequado, pois um excesso constante de tédio pode levar a problemas como falta de motivação e isolamento social. Encontrar maneiras construtivas de lidar com o tédio, seja através da busca por novas atividades ou pela aceitação e compromisso com momentos mais monótonos, pode ser fundamental para manter um bem-estar mental saudável.

Em algumas formas de terapia, como a Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT), aprende-se a lidar com o tédio de maneira construtiva, utilizando-o como um sinal para ações alinhadas aos valores pessoais.

Sonhar acordado

Sonhar acordado pode ser “um completo respiro” e fornecer uma breve fuga da vida cotidiana. Diversos estudos já demonstraram, por exemplo, que ferramentas modernas, como o e-mail, as redes sociais e os aplicativos de encontros, podem desafiar a saúde mental. 

Um artigo Psychology Today destaca que o excesso de informação pode reduzir a capacidade de atenção. O estudo publicado em 2022 por um grupo de pesquisadores da West University of Timisoara (Romênia), sugere que fazer pequenas pausas no trabalho pode aumentar o bem-estar e, consequentemente, a produtividade.

Liderada por Patricia Albulescu, a equipe por trás da análise diz que pausas de até 10 minutos ajudam a reduzir a fadiga e aumentar a energia. Segundo a especialista, quando executamos tarefas diárias de forma forçada e cansativa e ignoramos nossas necessidades, pode haver consequências, incluindo falta de atenção e erros. 

Por isso, descansar pode ser uma oportunidade valiosa para ajudar nossos cérebros sobrecarregados a relaxar e aliviar o estresse. Afastar-se das redes sociais e de outros fatores de estresse, por exemplo, por tempo suficiente é benéfico. Que tal escolher momentos de descanso ou relaxamento em meio à natureza, com as pessoas que você gosta? Não precisa ficar parado sozinho, é importante estar com outras pessoas. 

Podemos, então, considerar o tempo de inatividade, o tédio ou a ociosidade como uma limpeza mental: uma forma de liberar nossa mente da congestão cognitiva acumulada. Por isso, a questão não é tanto que precisamos nos deixar entediar, mas, sim, que precisamos valorizar o tempo vazio, pois ele está diretamente relacionado com a saúde mental.

Colaboração: Mônica Merlini

Fontes:

https://www.quantamagazine.org/what-your-brain-is-doing-when-youre-not-doing-anything-20240205/

https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0272460

https://www.bbc.com/portuguese/geral-64046582

The Science of Boredom: The Upside (and Downside) of Downtime. Sandi Mann, 2018.