Você gosta de apostar em jogos esportivos? Quais os riscos para a saúde mental? Maria Alice Fontes

O mercado de apostas esportivas no Brasil está em crescimento, e cada vez mais pessoas estão se interessando por esse tipo de entretenimento. Além das perdas financeiras, o impacto negativo dos jogos online atinge qualidade de vida, produtividade, relacionamentos e saúde mental e física. Nesta segunda-feira(22) participei de uma entrevista no Programa Nova Manhã – Novabrasil FM – sobre o assunto. 

Segundo recente pesquisa do Datafolha, os gastos dos brasileiros com jogos e apostas online, chamadas bets, atingiram cerca de R$ 11,1 bilhões entre janeiro e novembro de 2023. 

A pesquisa mostrou ainda que 15% da população brasileira diz apostar ou já ter apostado de forma online. O gasto médio mensal entre o total das pessoas que apostam é de R$ 263, equivalente a 20% do salário mínimo em 2023. 

O fenômeno é ainda maior entre os jovens, o que agrava mais a situação. Quase um terço das pessoas entre 16 e 24 anos disse já ter apostado. A supervisão parental cuidadosa e educação sobre o uso responsável da tecnologia são passos cruciais para evitar que a diversão digital se transforme em uma jornada arriscada para a saúde e o bem-estar.

Isso porque a perda de controle sobre a quantidade de tempo e de dinheiro apostados pode configurar uma dependência comportamental. Quando se perde uma aposta, pode-se entrar numa escalada de arriscar mais para tentar evitar a dor da perda, criando um ciclo vicioso de apego às apostas. 

Estudos da psicologia comportamental mostram que o atraso que acontece entre o sentimento no momento da aposta e a perda ou recompensa, provoca aumento na velocidade e frequência do apostar, sem a consequência negativa imediata. Esse atraso faz com que a pessoa fique viciada no prazer da aposta, devido a ativação de partes específicas do cérebro responsáveis pelo prazer.

Quais são os indícios de um possível quadro de jogo patológico?

(1) a atividade de jogo ocupa significativa parte dos pensamentos da pessoa,

(2) há uma constante necessidade de aumentar apostas para obter a mesma satisfação,

(3) alterações de humor surgem ao tentar reduzir o jogo,

(4) Isolamento social,

(5) o jogo é utilizado como escape emocional,

(6) há uma frequente volta ao jogo na tentativa de recuperar perdas,

(7) há mentiras para encobrir o envolvimento e, ainda,

(8) endividamento ou envolvimento em atos ilegais em busca de mais jogo. Ex: Homem endividado forja próprio sequestro e acaba preso por estelionato no Rio.

Assim como o tratamento de outros vícios, a compulsão por apostas também é tratável, mas de forma multidisciplinar. O primeiro passo é reconhecer que há um problema e buscar ajuda de um profissional da saúde mental, que poderá avaliar o quadro e planejar as intervenções específicas como a Terapia Cognitivo Comportamental (TCC), o envolvimento da família e às vezes o uso de medicamentos. 

A TCC é frequentemente usada para tratar a dependência de jogos. Ela ajuda os indivíduos a entender e modificar padrões de pensamento e comportamento prejudiciais, promovendo a mudança de hábitos. O envolvimento da família é essencial, especialmente se o comportamento de jogo afeta as relações familiares. A terapia familiar pode ajudar a melhorar a comunicação e o apoio, pois é muito comum existir a mentira com a tentativa de esconder sobre o jogo e eventuais dívidas.

Isso pode acontecer porque o vício em jogos, em geral, ocorre concomitantemente com outros transtornos de saúde mental, como ansiedade, depressão, impulsividade, ou seja, a pessoa já tem um problema pré-existente. Nestes casos, ela passa a acreditar que as emoções das apostas aliviam o seu desconforto, elevando seu humor e fazendo com que se sintam melhor, ainda que temporariamente.

Também é importante identificar os gatilhos que levam ao jogo e encontrar maneiras de evitá-los. Um dos principais problemas é o acesso rápido e irrestrito das plataformas de jogos no celular. Assim como as redes sociais, a pessoa pode ficar dependente deste comportamento de ficar no celular a maior parte do seu dia, sem perceber. Limitar fisicamente o acesso a dispositivos de jogos ou jogos online pode ser uma medida eficaz para prevenir recaídas.

Cinco anos após ter sido autorizado, o funcionamento de casas de apostas online no Brasil  até hoje não foi regulamentado. O projeto de lei que busca estabelecer as regras para o setor foi aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. O texto, que ainda precisa ir a plenário, traz mudanças importantes. Uma delas é a obrigatoriedade do reconhecimento facial nas plataformas, tornando mais difícil a participação de menores de idade.

Fontes: 

https://time.com/6342504/gambling-addiction-sports-betting-college-students/https://research.monash.edu/en/projects/neural-metabolic-connectivity-in-ageing-and-neurodegeneration

https://www1.folha.uol.com.br/esporte/2024/01/brasileiros-gastaram-mais-de-r-50-bilhoes-em-apostas-online-em-2023.shtml

https://www1.folha.uol.com.br/esporte/2024/01/apostas-atraem-jovens-e-chegam-a-15-da-populacao-que-diz-gastar-r-263-por-mes-mostra-datafolha.shtml