Quando o amor se torna patológico e se deve procurar ajuda? Janaina Batista Gonzalez Reis, Maria Alice Fontes

Questões referentes ao relacionamento conjugal e dificuldades amorosas costumam ser grandes motivadores pela busca de profissionais de saúde mental. Estes também são temas que frequentemente aparecem durante a maioria dos processos terapêuticos.

O que é amor?

O significado do termo amor pode variar de pessoa para pessoa, de acordo com sua experiência, cultura e valores. O amor é comumente reconhecido como um sentimento que predispõe alguém a se dedicar e desejar o bem a outro, e a se interessar em estabelecer proximidade e intimidade, afeição e desejo sexual.

São muitas as formas de se descrever esse termo, assim como podem ser diversas as formas de sentir e vivenciar o amor. Não podemos pressupor, na compreensão do que é amor, que todos deveriam seguir uma cartilha na forma de expressar seus sentimentos ou vivenciá-los em seus relacionamentos, ignorando a singularidade que nos é própria (REIS, 2017). 

O que é o amor patológico?


O amor patológico é um comportamento repetitivo e sem controle, de prestar cuidados e atenção excessiva ao parceiro, de forma prioritária para o indivíduo em detrimento de outros interesses, mesmo tendo evidências concretas que tal comportamento é prejudicial para a sua vida, ou de seus familiares. (SOPHIA, 2018).

Quais são os estágios de uma relação saudável e como diferenciar do amor patológico?

Os estágios que contemplam um relacionamento saudável são: atração (física e/ou emocional); paixão; o amor saudável, desilusão e ou rompimento. No amor patológico, diferente do que ocorre no amor saudável, o relacionamento não evolui, ficando estagnado na fase da paixão, sem chegar ao amor maduro.

Ao investigarmos o tipo do vínculo presente na relação do casal, evidenciamos que no amor patológico observa-se um vínculo compensatório, onde um parceiro delega ao outro, funções psicológicas que deveriam ser de sua própria responsabilidade.

Quais são os padrões dos relacionamentos não saudáveis?

Os relacionamentos não saudáveis são aqueles onde os cônjuges possuem independência e condições de natureza prática de romper o relacionamento e recomeçar suas histórias pessoais, porém optam por permanecer na relação em detrimento do continuado sofrimento, mas com ganhos secundários de diferentes naturezas.

Muitos questionamentos surgem sobre a dinâmica instalada na relação não saudável. Nesses casos, comumente ouvimos “pré-conceitos” associados a possibilidade de que um dos cônjuges ou ambos, não tenham interesse em sair do relacionamento, apesar de viverem relações patológicas.

Cada situação deve ser ouvida e acolhida individualmente, sendo impossível questionar o dilema enfrentado sem se conhecer profundamente a história pessoal e do casal. Nesse caso, mostra-se importante compreender a forma como a pessoa em questão reconhece o afeto, bem como foram suas vivências desde o início da vida e a maneira com que estabelece vínculos.

Como identificar o amor patológico?

Algumas particularidades levantadas a partir de estudos de caso, podem nos ajudar a reconhecer as características do amor patológico. Alguns exemplos são:

* Sintomas de abstinência – podem ocorrer sintomas físicos (ex: Insônia, taquicardia, agitação ou letargia), quando o parceiro está distante ou quando ameaça romper a relação;
* Cuidado excessivo com os interesses do parceiro;
* Falta de controle da atitude de prestar atenção ao parceiro;
* Uso de técnicas para controlar o parceiro;
* Abandono de interesses e atividades próprias;
* Manutenção da relação, mesmo com consciência das consequências negativas.

Quais são as características de personalidade das pessoas que se envolvem em amor patológico?

Para melhor compreensão das pessoas com amor patológico e da forma como vivenciam seus relacionamentos, faz-se necessário abordarmos a personalidade e sua maneira de amar.

A impulsividade é um aspecto marcante da personalidade, sendo comum atitudes sem planejamento prévio e até a escolha precipitada dos parceiros.

A autotranscendência é um traço de personalidade que envolve a expansão de limites pessoais, com a presença de experiências e ideias espirituais, como considerar-se parte integrante do universo. Esse traço pode ser identificado, quando se nota a dificuldade de estabelecer limites entre essas pessoas e suas parcerias, demonstrando medo de estar só e alto nível de dependência emocional.

Outro aspecto de personalidade comum a pessoas com o amor patológico é a baixa autoestima e a dificuldade em estabelecer objetivos e manter o foco até sua realização.

Quanto a sua maneira de amar, apresentam uma constante sensação de estarem “presas”, já que costumam manter relacionamentos insatisfatórios, sem conseguirem ter a atitude de melhorá-los ou até de romper a relação. Costumam ser possessivas, apresentado medo de serem abandonadas e vinculam-se a seus parceiros de forma insegura e instável.

Quais são as causas do amor patológico?

As possíveis causas do amor patológico são multifatoriais: carência afetiva no início da vida ou vínculos frágeis; questões de saúde mental, como baixa autoestima e sensação constante de rejeição, bem como sintomas depressivos e ansiosos.

O amor patológico é predominante em algum gênero?

Ainda não existem pesquisas epidemiológicos que informem a incidência do amor patológico entre os gêneros, mas estudos de casos realizados no Brasil mostram não existir diferença entre homens e mulheres. Importante salientar que as pesquisas e experiências clínicas apontam intenso sofrimento, independente do gênero, tanto em casais hétero, como em casais homossexuais.

O que fazer quando desconfiar que está vivendo uma relação de amor patológico?

O primeiro passo é procurar a avaliação de um profissional de saúde mental, que irá pesquisar os vínculos atuais e investigar os relacionamentos desde a infância, buscando identificar certos padrões que podem indicar sinais de uma relação patológica. O tratamento através da psicoterapia pode ajudar a identificar esses padrões, fortalecendo a autoestima para que o processo de decisão sobre a manutenção ou o rompimento do vínculo patológico seja feito de forma resiliente, consciente e esclarecida.

Bibliografia:

Reis, J. B. G. (2017). A construção de um relacionamento na perspectiva do poliamor (Dissertação de mestrado). Pontifícia Universidade Católica (PUC), São Paulo, Brasil.
Sophia, E. C., & Cordás, T. A. (2018). Como lidar com o amor patológico: guia prático para pacientes, familiares e profissionais da saúde. 1. ed. São Paulo: Hogrefe
Sophia EC, Tavares H, Berti MP, Pereira AP, Lorena A, Mello C, Gorenstein C, Zilberman ML. Pathological love: impulsivity, personality, and romantic relationship. CNS Spectr. 2009 May;14(5):268-74. doi: 10.1017/s1092852900025438. PMID: 19407726.