Alterações na fala infantil: reflexões sobre as possibilidades de intervenção. Christiane Buckeridge, Juliana Ortiz, Maria Alice Fontes

Atualmente, tem-se observado um número considerável de crianças que apresentam dificuldades na fala, o que pode ocorrer tanto por um atraso no desenvolvimento da fala, quanto por algum transtorno no decorrer deste processo como, por exemplo: transtorno do espectro autista, apraxia de fala na infância, atraso motor, síndromes, alterações auditivas, problemas neurológicos, dificuldade na motricidade oral, dentre outros.

Algumas crianças podem apresentar boa compreensão, mas a fala e sua comunicação expressiva, podem estar aquém do esperado para a idade, sendo algo muito desafiador. que precisará de diagnóstico e intervenção.

Vale ressaltar que os atrasos na fala devem ser investigados por um profissional da fonoaudiologia capacitado, pois esperar muito tempo para que a fala se desenvolva, pode trazer prejuízos ao desenvolvimento infantil.

Como se dá o início do desenvolvimento da fala?
Existem algumas habilidades que precedem a fala, as quais são importantes observar no desenvolvimento da criança, como: ouvir, imitar, olhar e prestar atenção.

Desde o nascimento, as crianças se comunicam por meio do olhar e do choro e são capazes de discriminar vozes pela entonação. Iniciam suas vocalizações, já nos primeiros meses, quando balbuciam interagindo com algum adulto.

Próximo dos quatro meses, já devem ser capazes de vocalizar sons consonantais e produzir algumas sílabas, sem intenção de comunicação. Quando chegam no primeiro ano de vida, descobrem a sua própria voz e assim vão adquirindo cada vez mais sons, até chegar em suas primeiras palavras: “mama”, “papa”, “tete”, “não”, sendo estas já com intenção de comunicar-se.

Por volta dos dois anos, a criança já deveria ter a capacidade de juntar palavras na intenção de formar frases simples como, por exemplo: “nenê qué”, “dá nenê” etc. A partir da imitação e dos modelos em seu meio, seu vocabulário vai sendo ampliado até que a criança consiga dialogar, interagir, perguntar e responder, fazer relatos de algo que tenha acontecido. Durante sos primeiros anos de vida a fala e linguagem vão se desenvolvendo progressivamente, aumentando a habilidade de comunicação.

No processo de aquisição da fala, quais são as alterações mais comuns apresentadas pelas crianças?
É importante saber que, durante o período de aquisição da fala alguns marcos do desenvolvimento são norteadores para o processo. Os fonemas são adquiridos progressivamente, de acordo com o nível de complexidade, e algumas crianças podem apresentar alterações na produção de alguns sons, necessitando de ajustes para adquiri-los.

Embora existam alterações de fala neste processo até os cinco primeiros anos de vida, alguns tipos de alterações exigem maior atenção.

Dentre essas alterações as mais comuns são:

• Substituição (bola/pola, casa/tasa)
• Omissão (parque/paque, escada/ecada)
• Distorção (em casos de mal posicionamento da língua, o som sai alterado)

Existem alterações de sons mais complexos, como é o caso do /r /de barata:
• Substituição (baRata = baLata ou baiata)
• Omissão (baata)
• Omissão nos encontros consonantais com /r/ ou com /l/ (prata /pata, brinco /binco, planta /panta).

Até qual idade é normal a criança apresentar trocas na fala?
Os marcos do desenvolvimento são norteadores para o processo de aquisição da fala. Estudos mostram que existe uma sequência no aprendizado dos sons que vai dos mais fáceis até os mais difíceis. Considera-se que por volta dos 5 anos de idade, a criança estará com esse processo consolidado.

Podemos observar na tabela a seguir, as idades aproximadas para cada aquisição dos sons, representada pelas letras.

– Primeiros sons: P, B e M
– Até mais ou menos 2 anos de idade: T, D e N
– Normalmente perto de 2 anos e meio de idade: C, G e NH
– Aproximadamente aos 3 anos de idade: F, V, S e Z
– Geralmente aos 3 anos e meio: X e J
– 4 anos: L, LH e RR; sons com S (as, es, is, os, us), palavras no plural ou palavras como: “pasta”, “cesta”; sons com R; (Verbos onde o som do R aparece no final como: “comer”, “beber" ar, er, ir, or, ur)
– Por volta dos 5 anos: R de “girafa”, “morango”; encontros consonantais com R e L como: BR, CR, TR, DR, FR, PR, BL, CL, FL; exemplo: Brasil, trabalho, classe, flauta.

Esta sequência de aquisição de sons (fonemas), serve como parâmetro ou base do que podemos esperar em cada faixa etária, porém cada criança tem o seu ritmo de desenvolvimento, dentro dos marcos esperados para a idade. Algumas adquirem bem mais rápido e outras de maneira mais lenta.
É importante sempre fazer uma avaliação com um fonoaudiólogo, assim que observada alguma alteração, ou se passaram mais de seis meses da idade esperada para a produção de cada fonema.

Quais sugestões de estímulos podemos dar aos pais que têm filhos no processo de aquisição e desenvolvimento da fala?
Sabemos que a criança aprende por meio da imitação e quem apresenta primeiramente este modelo de fala são os pais, cuidadores e pessoas do convívio diário.

Por esse motivo, é importante que o modelo de fala seja adequado e motivador. Mesmo que a criança pronuncie uma palavra de maneira “errada”, a orientação é oferecer o modelo certo da palavra, não enfatizando o erro.

Sugere-se, também, que os pais estimulem a criança a pedir as coisas usando a fala e não somente apontando ou por meio de gestos. Quando atendemos as necessidades das crianças, sem pedir que ela nos fale o que realmente quer, não ensinamos a importância e eficácia de sua fala para a comunicação.

Quando devo procurar ajuda e qual profissional devo procurar?
Muito ouvimos dizer que: “cada criança tem o seu tempo”; “é normal”; “a criança é muito nova”; “quando ela for para a escola irá falar mais”. Entretanto, precisamos considerar que todas as alterações nos marcos do desenvolvimento da fala ou qualquer dúvida em relação a esse processo, a família não deve hesitar em procurar a orientação de um profissional.

O fonoaudiólogo está apto para uma avaliação e intervenção, assim como encaminhar a outros profissionais como: neuropediatra, ortodontista, otorrinolaringologista, neuropsicólogo, quando necessário. A conduta multidisciplinar e precoce irá favorecer o prognóstico e auxiliar na melhor intervenção, viabilizando um melhor desenvolvimento da criança.

Esclareça qualquer dúvida, sempre com um profissional especializado.

Referências Bibliográficas:

• Honora, M; Frizanco, MLE. Esclarecendo as deficiências. São Paulo: Ciranda Cultural, 2009.
• RMMG Volume 21 (4supl.1) Distúrbios da fala e da linguagem na infância. Speech and language disorders in childhood. Letícia Pimenta Costa Spyer Prates; Vanessa de Oliveira Martins
• http://www.atrasonafala.com.br/sinais-de-alteracoes.html
• https://www.paulamourafono.com.br