Redes Sociais: Um Equilíbrio Delicado entre Liberdade e Proteção. Maria Alice Fontes.

A presença de redes sociais na vida cotidiana é um efeito significativo, especialmente para crianças e adolescentes. No entanto, com os crescentes debates sobre os riscos e benefícios, surge uma questão crucial: devemos proibir ou apenas controlar o acesso das crianças e adolescentes às redes sociais?

Recentemente, quatorze estados americanos processaram o TikTok, acusando a plataforma de prender usuários jovens por meio de funções compulsivas que prejudicam sua saúde mental e violam sua privacidade. Recursos como filtros de beleza, rolagem infinita de vídeos e a busca incessante por “curtidas” exploram a curiosidade e a dificuldade dos jovens em interromper seu uso.

Interações neurocomportamentais

Um estudo com adolescentes revelou relações preocupantes entre a duração do sono, o uso das redes sociais e a atividade cerebral nas regiões frontolímbicas, que são cruciais para o controle executivo e o processamento de recompensas. Analisando dados do estudo Adolescent Brain Cognitive Development (ABCD), os pesquisadores encontraram uma correlação significativa: a menor duração do sono está fortemente associada ao uso intenso de mídias sociais e a alterações na atividade cerebral.

Nos Estados Unidos, 45% dos adolescentes estão online quase constantemente. À medida que as redes neurais relacionadas a emoções e recompensas amadurecem antes das funções executivas, os jovens em início de adolescência enfrentam um risco elevado de problemas de saúde mental e dificuldades no sono. O sono adequado é vital para o desenvolvimento neurológico e a regulação emocional, mas o uso excessivo de telas frequentemente substitui tanto o sono quanto atividades que favorecem o desenvolvimento cognitivo.

Pesquisadores analisaram dados de 1.982 adolescentes, com uma média de idade de 12 anos. A duração do sono foi avaliada por meio do Questionário do Cronótipo de Munique, enquanto o uso recreativo de redes sociais foi mensurado pelo Youth Screen Time Survey. A ressonância magnética funcional foi empregada para examinar a atividade neural durante uma tarefa de incentivo financeiro. 

Os resultados, ajustados por idade, momento da pandemia e características sociodemográficas, mostraram uma associação significativa entre menor duração do sono e maior uso de redes sociais (p < 0,001). Além disso, a atividade cerebral revelou que o uso intenso de redes sociais estava ligado à menor ativação nas áreas frontais responsáveis pela função executiva.

Complementando a discussão, no livro “The Emotional Lives of Teenagers: Raising Connected, Capable, and Compassionate Adolescentes”, a autora e psicóloga, Dra. Lisa Damour, esclarece que o uso das redes sociais pode interferir no engajamento de outros comportamentos saudáveis como dormir bem, fazer trabalhos escolares, interagir com amigos ou ser útil em casa ou na comunidade. 

Tempo nas redes sociais aumenta risco de ansiedade e depressão em adolescentes

Outro estudo da Universidade de Oxford revelou que o tempo excessivo nas redes sociais está associado ao aumento da ansiedade e da depressão em adolescentes. Cerca de 60% dos jovens entre 16 e 18 anos passam de duas a quatro horas diárias em plataformas como Instagram, Snapchat, TikTok, WhatsApp e YouTube. 

A pesquisa mostrou que quanto mais tempo dedicam a essas redes, maiores são os níveis de ansiedade e depressão relatados. O professor John Gallacher, líder do estudo, afirmou: “Encontramos uma relação direta entre o aumento do tempo gasto em redes sociais e as taxas de ansiedade e depressão.” Nos casos mais extremos, muitos jovens relataram passar até oito horas diárias nessas plataformas.

Além disso, o estudo destacou que as meninas são mais propensas a sofrer os impactos negativos do uso excessivo, frequentemente se comparando a imagens idealizadas, o que pode afetar sua autoestima. A pesquisa contou com a participação de mais de 7.000 adolescentes e cerca de 50.000 jovens de 11 a 18 anos em todo o Reino Unido, analisando suas trajetórias de saúde mental ao longo de uma década.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) já havia alertado sobre o tempo de tela entre os jovens, definindo o uso problemático de redes sociais como um padrão de comportamento que gera sintomas semelhantes aos de dependência. Isso inclui a incapacidade de controlar o uso, o sofrimento em períodos sem acesso e a negligência de outras atividades em favor das mídias sociais.

Impactos da Redução do Tempo de Tela

Em apenas duas semanas, os pais podem ver melhorias significativas na saúde mental e no comportamento de seus filhos ao reduzir o tempo de tela das crianças para apenas três horas semanais, de acordo com uma nova publicação no JAMA Network Open.

Em média, as crianças passam de sete a oito horas por dia em telas para entretenimento. No entanto, quando as crianças reduziram drasticamente seu tempo de tela, elas mostraram melhorias significativas em seu comportamento geral e bem-estar emocional.

Pesquisadores da Universidade do Sul da Dinamarca analisaram dados coletados de 89 famílias com 181 crianças e adolescentes entre quatro e 17 anos.

Pesquisas anteriores publicadas no JAMA Pediatrics mostraram que o tempo de tela deve ser proibido para crianças até os 3 anos de idade, pois isso pode levar a atrasos no desenvolvimento.

Pesquisadores da Universidade Drexel descobriram que bebês e crianças pequenas que têm tempo de tela têm maior probabilidade de apresentar comportamentos sensoriais atípicos associados a distúrbios do neurodesenvolvimento, como autismo e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).

Os pesquisadores também descobriram que a quantidade de tempo de tela permitido aos bebês e sua idade impactaram diretamente seu desenvolvimento. Cada hora de tempo de tela diário aumentou as chances da criança apresentar problemas sensoriais em 23% aos 18 meses, mas caiu para 20% aos 24 meses.

Como os pais podem ajudar os filhos?

Os pais desempenham um papel crucial em ajudar os filhos a equilibrar o uso das redes sociais. Veja abaixo algumas estratégias eficazes em prol da segurança e do bem-estar: 

Estabelecer Regras Claras: Crie limites sobre o tempo e o tipo de conteúdo que podem ser acessados. Discuta as regras em família para garantir que todos estejam de acordo.

Promover o Diálogo Aberto: Incentive conversas honestas sobre o que os filhos veem e experimentam nas redes sociais. Pergunte sobre suas interações e sentimentos em relação ao conteúdo que consomem.

Modelar Comportamentos Saudáveis: Seja um exemplo positivo. Demonstre um uso equilibrado das redes sociais e compartilhe suas próprias experiências.

Fomentar Atividades Offline: Incentive a participação em atividades que não envolvem telas, como esportes, leitura ou encontros com amigos, para criar um estilo de vida equilibrado.

Estabelecer Períodos de Desconexão: Introduza momentos sem tecnologia em casa, como durante as refeições ou antes de dormir, para promover interações pessoais e o bem-estar emocional.

Estar Atento às Mudanças de Comportamento: Observe sinais de que o uso das redes sociais está afetando a saúde mental ou o bem-estar dos filhos. Esteja pronto para intervir e procurar ajuda profissional, se necessário.

Conclusão

Para responder à questão central deste artigo, sobre se devemos proibir ou apenas controlar o acesso de crianças e adolescentes às redes sociais, é importante considerar as mudanças de comportamento que essas tecnologias podem causar nesse público. As novas tecnologias, especialmente as redes sociais, estão moldando a maneira como crianças e adolescentes se conectam e interagem, o que torna fundamental entender essas interações para orientar um uso consciente e responsável dessas ferramentas.

Portanto, a adoção de um equilíbrio, com controle de acesso, educação e diálogo, parece ser mais eficaz do que uma proibição total. Essa abordagem permite que crianças e adolescentes desenvolvam as habilidades necessárias para um uso saudável e responsável das redes sociais, sem privá-los das oportunidades de aprendizado e socialização que essas plataformas podem oferecer.

Colaboração: Mônica Merlini

Fontes:

https://jamanetwork.com/journals/jamanetworkopen/fullarticle/2821176

https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/39370520/

https://cetic.br/media/analises/tic_kids_online_brasil_2023_principais_resultados.pdf

“The Emotional Lives of Teenagers: Raising Connected, Capable, and Compassionate Adolescentes”.