Alimentando o cérebro: qual a relação entre nutrição e saúde mental? Dr. Thiago Fernando da Silva, Maria Alice Fontes

A relação entre a saúde mental e os hábitos de vida é um dos assuntos mais estudados no momento. Com base em modernas técnicas de pesquisa, inicia-se um fascinante processo de descoberta dos mecanismos biológicos associados com tal relação. Enquanto os cardiologistas e endocrinologistas defendem hábitos de vida saudáveis para perder peso, controlar os níveis de açúcar e colesterol no sangue, ainda é raro que as pessoas prestem atenção nas necessidades nutricionais do órgão mais complexo de nosso corpo: o cérebro.

Existe relação da dieta com a saúde mental?

Hoje sabemos, baseados em conhecimentos neurocientíficos, que existe uma relação entre os transtornos mentais, como quadros depressivo, ansiosos e até síndromes demenciais com hábitos de vida pouco saudáveis, como comportamento sedentário, uso de álcool e cigarro e padrões alimentares ruins.

Como os micronutrientes chegam ao cérebro?

Nossa dieta é um dos principais determinantes da nossa saúde mental. De uma maneira geral, as dietas ocidentais são abundantes em calorias, porém pobres em micronutrientes essenciais para o funcionamento de nosso cérebro. Cada vez mais fala-se sobre o eixo microbiota-intestino-cérebro, que é o processo de sinalização que ocorre entre o trato gastrointestinal e o sistema nervoso central, e que está relacionado diretamente com nossa alimentação. Microbiota é o conjunto de microorganismos encontrados em determinado local como, por exemplo, no intestino. Possuímos bilhões de microorganismos “bons” em nosso intestino, responsáveis por diversos processos essenciais para nossa saúde.

Quais são os micronutrientes necessários?

O funcionamento normal de nossos cérebros depende de certos micronutrientes e eles devem ser obtidos a partir da dieta. Por exemplo, várias vitaminas do complexo B determinam o funcionamento do sistema nervoso. As vitaminas B-6 e B-12 são necessárias para a produção de neurotransmissores.         

Segundo a Organização Mundial da Saúde, existem 19 vitaminas e minerais essenciais (micronutrientes); vitaminas A, C, D, E e K, todas as vitaminas do grupo B (8 no total) e os minerais cálcio, iodo, ferro, magnésio, selênio e zinco.

Qual a melhor dieta para o cérebro?

De acordo com um estudo americano de 2017, apenas 1 em cada 10 pessoas consome a quantidade diária recomendada de frutas e vegetais. Esses maus hábitos alimentares podem contribuir para o grande aumento dos casos de depressão que observamos. Um outro estudo mostrou que pessoas que seguiram por 12 semanas um padrão de dieta mediterrânea (rica em grãos integrais, frutas, legumes, frutos do mar) apresentaram melhora do humor e diminuição dos níveis de ansiedade. Tal dieta contribui para um desenvolvimento adequado das bactérias saudáveis que possuímos em nossos intestinos, importante para diversas funções, como a síntese de substâncias como serotonina.

A dieta pode tratar os transtornos de saúde mental?

A ideia é aliar os tratamentos mais comuns, como psicoterapias e uso de medicações, com intervenções amplas em hábitos de vida, incluindo um padrão mais saudável e consciente de alimentação.

É importante ressaltar que não existe uma dieta única que seja boa para todo mundo, porém pequenas mudanças podem impactar de forma positiva nossa saúde mental, como diminuir o consumo de alimentos processados e carne, e aumentar a ingesta de alimentos ricos em fibras, como frutas e legumes, além de peixes e frutos do mar.

É indicado fazer suplementação alimentar?

Diversos tratamentos psiquiátricos atuais incluem intervenções nesse sentido, como orientações nutricionais amplas e até mesmo suplementação de substâncias que estejam em falta no nosso organismo, como vitaminas do complexo B e ômega-3. Por exemplo, a vitamina B12, encontrada em carne, ovos e frutos do mar, regula importante mecanismos relacionados com nosso humor, além de impactar no processo de desenvolvimento do nosso cérebro. O ômega-3 é essencial para o funcionamento dos nossos neurônios.

Qual a recomendação médica para melhorar o funcionamento do cérebro?

Embora ainda não esteja claro se a suplementação de micronutrientes tem efeitos benéficos em vários domínios cognitivos, está bem estabelecido que as deficiências de micronutrientes, especialmente as de vitamina B, têm efeitos adversos na cognição. Uma boa dieta é importante para uma a saúde e a prevenção de doenças crônicas. Pesquisas indicam que uma porção significativa da população não está atendendo às atuais doses recomendadas de micronutrientes, incluindo vitamina E, magnésio, vitamina A e vitamina C.

Trata-se de um processo contínuo de aprendizagem, no qual nos tornamos mais conscientes de nosso corpo e conscientes de como ficamos quando ingerimos determinados alimentos. Procure um médico, um nutricionista. Na dúvida, o conselho de nossas avós ainda mostra-se extremamente válido: quando se trata de uma alimentação saudável, “descasque mais e desembrulhe menos”.

Bibliografia

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