Você passa mais tempo nas telas do que gostaria? Desconfia que seu companheiro, filhos e pessoas que o cercam estejam viciados em seus smartphones?
Hoje temos cerca de 2.5 bilhões de smartphones no mundo. Estes aparelhos mágicos promovem infinitas possibilidades, mas ao mesmo tempo são tão atraentes que muitos de nós se tornaram dependentes. O abuso da tecnologia não só tem um impacto na nossa qualidade de vida, saúde e felicidade, mas como também impacta as pessoas à nossa volta.
O Dr. Adam Alter, Ph.D. em Psicologia pela Princeton University e professor associado de Marketing e Psicologia na Universidade de Nova York vem estudando esse impacto há anos. Ele é, um dos mais renomados experts em dependência da mídia e das telas. Em seu livro “Irressistible”, lançado em 2017, Alter traz muitas informações sobre o assunto.
Qual o poder que as telas têm de causar vícios? Qual o impacto deste vício sobre nós? Quais as soluções para esse problema?
Vamos começar com uma pergunta. Você tem ideia de quanto tempo passa olhando para o seu smartphone por dia?
Kevin Holesh, designer de programas e especialista em IOS criou um aplicativo chamado ‘Moment’, com o objetivo de verificar quanto tempo cada um passa em diferentes aplicativos no seu celular. Tente fazer uma estimativa rápida agora. Quantas horas por dia você fica ligado/conectado?
Se você respondeu cerca de 2 horas, essa é a resposta padrão da maioria das pessoas, mas infelizmente nós subestimamos quanto tempo estamos no telefone em pelo menos a metade do tempo. Os resultados do aplicativo ‘Moment’ apontam que a média de uso nos Estados Unidos era de cerca de 3 horas para os adultos em 2016, mas essa média vem crescendo para 4 horas por dia no último ano.
Quando consideramos o tempo que os adolescentes e jovens passam “plugados”, encontramos cerca de 6 a 7 horas por dia, ou até mais. Se considerarmos esse tempo projetado na vida, seria uma estimativa de cerca de 11 a 15 anos conectados a uma tela durante a vida inteira.
De acordo com Adam Alter, 46% dos jovens adultos dizem que preferem ter um osso quebrado do que um telefone quebrado. Esses são casos típicos do que ele chama de “Nomofobia”, ou seja, medo de estar sem o seu celular.
Nomofobia é a fobia causada pelo desconforto ou angústia resultante da incapacidade de acesso à comunicação através de aparelhos celulares ou computadores. Surge quando alguém se sente impossibilitado de se comunicar estando em algum lugar sem um aparelho de celular ou qualquer outro dispositivo com internet ou quando estes falham por motivos diversos. É um termo muito recente, que tem origem nos diminutivos inglês No-Mo, ou No-Mobile, que significa “sem celular”. Daí a expressão “Nomofobia” ou fobia de ficar sem um aparelho de comunicação móvel.
Qual é a razão de tamanha dependência?
Segundo Adam Alter existem algumas razões para a dependência.
A primeira delas reside no fato que temos esses aparelhos amplamente disponíveis, de forma tão próxima que quase não precisamos mover nossos pés durante o dia para alcança-los. O excesso da disponibilidade facilita o contato, oferecendo um impacto psicológico direto de como vivemos nossas vidas. Não ter o celular por perto provoca um mal estar psicológico/físico, então estamos com ele dentro do nosso raio de alcance o dia todo.
A segunda razão é que existem algumas características psicológicas inerentes a experiência de usar o celular que nos prendem a ele. Por exemplo, a ausência de “dicas de parada”. O mundo atual tem uma ausência de sinais que indicam que devemos parar algum comportamento. Por exemplo, quando você está lendo um livro ou assistindo a um filme, existe o fim. Temos a sensação de ter finalizado algo e decidimos se passamos para o próximo capítulo. Planejamos o que vamos fazer depois de terminar uma etapa. Acontece que hoje as mídias sociais não têm uma dica de parada. Podemos rolar o Instagram horas sem ter fim. Pulamos de um aplicativo para outro de forma automática, sem ter a sensação que finalizamos algo.
A terceira razão para a dependência seria a quantidade de recompensas que o eletrônico nos traz durante o dia. Essas recompensas nos propiciam doses pequenas de prazer, durante todo o período de interação com o celular devido a liberação de dopamina, o neurotransmissor do prazer. Por exemplo, os “likes” que recebemos numa foto, dão prazer. Receber uma mensagem no WhatsApp dá prazer, saber que você andou determinados passos ou alcançou uma meta de quantidade de seguidores, gera um prazer imediato. Desta forma, passamos o dia inteiro liberando pequenas doses de dopamina, que nos tornam dependentes, pois ao longo do tempo, precisamos de doses cada vez mais elevadas para sentir a mesma sensação de bem estar/prazerosa.
Assim, a proximidade dos aparelhos, a falta de dicas de paradas e as recompensas que recebemos o tempo todo fazem desta experiência/interação cada vez mais difícil de resistir.
Apesar de não envolver nenhuma substância química externa, os smartphones desencadeiam um comportamento viciante. A definição de dependência comportamental é algo que fazemos repetidamente, que causa tolerância, sintomas de abstinência, distúrbios afetivos e problemas nas relações sociais.
O abuso da Internet pode criar dificuldades psicológicas, sociais, escolares e de trabalho na vida de uma pessoa. Segundo Alavi, que estudou 250 estudantes de diferentes faculdades, 18% dos participantes do estudo foram considerados usuários de internet patológicos, cujo uso excessivo da Internet estava causando problemas acadêmicos, sociais e interpessoais. O uso excessivo pode criar um aumento do nível de excitação psicológica, resultando em problemas com o sono, com a alimentação, além de falta de atividade física, levando o usuário a enfrentar problemas de saúde física e mental, como depressão, TOC, relações familiares problemáticas além de ansiedade e depressão.
Com relação as crianças, temos observado que o uso de smartphones faz com que eles se sintam menos conectados e distantes dos amigos. Segundo, Jean Twenge, autor do livro iGen, 31% mais alunos do 8o. ano relataram sentir-se solitários em 2015 em relação a 2011. Infelizmente, uma porcentagem maior de adolescentes relata sentir-se mais sozinhos agora do que em qualquer momento desde que a pesquisa começou em 1991.
Então, quais são as soluções? Todos queremos que nossos filhos, e nós mesmos, possamos ter uma vida com amizades reais, saudáveis ??e significativas. A realidade é que precisamos cuidar melhor disso.
Quais são as sugestões para controlar esse comportamento compulsivo?
Primeiramente é importante reconhecer que a nossa vida seria mais difícil sem tecnologia, e quando falamos em ter controle não estamos nos referindo à abolição dos smartphones das nossas vidas. Nos beneficiamos de tecnologia para conectar com outras pessoas, usamos email, SMS, Messenger, WhatsApp, etc.
Assim, nosso desafio está em observar e ponderar o uso e a frequência do smartphone, e de que forma isso estaria interferindo na sua vida?
Para muitas pessoas, o uso de smartphone está ligado a dificuldade de lidar com momentos em que está sozinho. Muitos de nós pega o celular nos elevadores, porque quer evitar o contato com outras pessoas. Se você eventualmente está se sentindo ansioso, o celular pode servir como um calmante. Você pode estar achando que enfrenta a solidão, ansiedade, depressão com o seu celular, mas se você está fazendo isso, saiba que não está tratando a causa, simplesmente está dando voltas e evitando os sintomas, sem tratar.
O melhor seria compreender o impacto que o celular tem em você e nas pessoas à sua volta quando abusa do uso, e buscar mudanças progressivas. Assim, se você percebe que está usando muito o seu celular a primeira atitude seria buscar uma certa distância física, deixando-o guardado em algum momento do seu dia, de forma que você não o tenha ao seu alcance direto em um determinado momento do dia, todos os dias.
Uma recomendação seria deixar o telefone guardado dos momentos de refeição, sem levar para a mesa no café da manhã, almoço e jantar, mesmo que você esteja sozinho. As pessoas que conseguem fazer isso relatam ter experiências mais ricas de interação com as pessoas. Procure outra atividade como ler ou simplesmente apreciar a comida naquele presente momento, caso esteja sozinho. Além disso, a família toda pode se beneficiar de uma boa noite de sono, ao deixar todos os dispositivos carregando em um lugar comum da casa durante as horas de sono.
Uma outra recomendação valiosa é ter a consciência de buscar alternativas ao uso do celular em determinados momentos. Você pode tentar alternativas, desde meditar, até passar na casa de um amigo ou vizinho, praticando a experiência de interações pessoais. É muito difícil fazer isso quando temos nossos celulares disponíveis, mas você pode determinar, por exemplo, que das 7:00 as 8:00 da manhã ou da noite, irá fazer alguma atividade esportiva ao ar livre com outras pessoas, sem o seu celular presente.
Outra ideia é ficar atento às dicas de parada, conforme mencionado acima. Como não temos muitas destas dicas no nosso dia, uma sugestão seria, enquanto você está fazendo alguma atividade, assistindo TV ou trabalhando, deixe o seu celular distante com um alarme e pare a cada intervalo que você determinar. Para isso você precisará levantar e deixar o que estava fazendo, pensando de forma consciente se deve continuar ou passar para outra atividade.
Outra sugestão seria ampliar a consciência sobre os efeitos das recompensas que os celulares trazem e encontrar outras formas de prazer no mundo real, em vez de esperar ansiosamente pelos ‘likes’, comentários e mensagens nos posts. Tente identificar mais recompensas e prazeres no mundo real. Promova interações familiares e peça que todos deixem seus celulares de lado por um tempo.
Nós podemos controlar nosso uso, mas para isso precisamos estar absolutamente conscientes das necessidades de ter dicas de parada, maior frequência de relacionamentos pessoais e menos busca de gratificação imediata exclusivamente através dos celulares.
Esperamos que você tente baixar o aplicativo Moment para identificar quanto tempo tem ficado no celular, pois esse pode ser um primeiro e importante passo para tomar consciência do tamanho da mudança que sua vida precisa ter.
Bibliografia:
Adam Alter. Irresistible: The Rise of Addictive Technology and the Business of Keeping Us Hooked. Hardcover – March 7, 2017
Alavi, SS; Maracy, MR; Jannatifard, F; Eslami, M (2011). “The effect of psychiatric symptoms on the internet addiction disorder in Isfahan’s University students”. Journal of Research in Medical Sciences. 16 (6): 793–800.
Jean M. Twenge. iGen: Why Today’s Super-Connected Kids Are Growing Up Less Rebellious, More Tolerant, Less Happy–and Completely Unprepared for Adulthood–and What That Means for the Rest of Us Hardcover – August 22, 2017